Celebrar 50 Anos de Abril

Nuno Mascarenhas,  Presidente da Câmara Municipal de Sines

Portugal viveu 48 anos de ditadura. Portanto, o tempo de Democracia que comemoramos, 50 anos, supera ligeiramente o tempo que o País viveu mergulhado no obscurantismo de uma ditadura que sacrificou gerações e que se foi intensificando ao ponto de condenar a juventude de muitos rapazes à fatal participação numa guerra em que ninguém acreditava.

A madrugada de 25 de abril de 1974 foi possível porque um movimento de oficiais dos diversos ramos das Forças Armadas se organizou, desiludidos com o País e cansados de uma guerra sem solução militar à vista. Este movimento contou com a adesão de muitos jovens que estavam nos quartéis, marcharam sobre Lisboa e depuseram um poder envelhecido, mantido apenas pela força da repressão, e que nenhum enquadramento encontrava no mundo ocidental da altura. Temos de lhes agradecer. Como temos de agradecer a todos os que lutaram contra o poder repressivo e mantiveram na clandestinidade organizações políticas de resistência.

A Democracia trouxe-nos um novo mundo. Partidos políticos livres, a escola pública para todos, o Serviço Nacional de Saúde, trabalho justo, um percurso em direção à igualdade, o fim da guerra e do delito de opinião, entre muitos outros pilares do Estado de Direito. E trouxe-nos o Poder Local Democrático. Foi o Poder Local, as Câmaras Municipais e as Freguesias, a principal alavanca do desenvolvimento territorial português: a infraestruturação do território, com a disseminação das redes de energia, de água e de saneamento, a oferta de serviços públicos, os primeiros programas de habitação pública e o desenvolvimento de políticas sociais para os mais desfavorecidos.

O 25 de abril de 1974 colocou Portugal na rota do desenvolvimento e do desenvolvimento do território. O Poder Local Democrático, criado praticamente de raiz, foi fundamental para esse largo conjunto de objetivos centrais de democratização e de desenvolvimento.

Esta evocação dos princípios e dos valores da Democracia, contudo, não deve e nem pode ser feita num tom revivalista. O legado de que falo não é uma memória presa no passado, o legado de que vos falo deve ser um projeto para o futuro. Nestes 50 anos muitas coisas de passaram, a Democracia transformou-se e adquiriu novas formas de ser vivida e exercida, mas não a podemos nem dar por adquirida como algo absolutamente certo, tão pouco ter qualquer tipo de condescendência para com a sua relativização. A Democracia tem de ser central na nossa ordem social.

Bem sabemos que o contexto atual levou a que muitos deixassem germinar as dúvidas nas instituições democráticas, que crescesse ceticismo sobre as organizações políticas, que surgisse descontentamento em torno do exercício político. A solução para se ultrapassarem as dificuldades da Democracia é a própria Democracia. É a participação. É o exercício dos direitos que a Constituição de 1976 nos confere enquanto cidadãos. A fragilização das instituições democráticas, seja através do populismo seja através da promoção do seu descrédito, servirá apenas aqueles que acreditam na Democracia dos poucos. A Revolução de abril de 1974 foi o contrário disso, foi a Democracia de todos e é essa que temos de reafirmar todos os dias, transmitir às gerações mais novas e preservar, preservar construindo.

Nuno Mascarenhas

Presidente da Câmara Municipal de Sines

Suplemento 25 de abril – Leme 852