HISTÓRIA

Dedicar algumas palavras ao Leme pelos seus 30 anos de vida não é tarefa fácil. Recuando no tempo, vêm-nos à memória outros tempos, marcados por peripécias e aventuras de quem vivia um tempo de “pioneirismo”, onde quase nada se tinha e o que se queria fazer era muito, em prol do bem de uma população crescente cujos direitos e condições de vida urgia defender.

O Leme terá nascido como “filho” de homens com grandes ideais que se dedicavam à causa da Justiça aliada ao serviço da Fé: Padre Manuel Malvar, Justino Pires, António Moura, Ernesto Jana, Fernando Varandas e António Vieira. Todas eram pessoas ligadas ao meio pela profissão e por se dedicarem visivelmente às suas comunidades, onde despertavam consciências, levando outros a lutar pelo bem comum. Concretamente em Santo André, onde o Leme tinha o seu pequenino canto, havia apenas gentes, mas gentes com uma qualidade humana muito especial: oriundos de vários lugares, (muitos deles vindos das ex-colónias de África), as suas formas de estar e culturas expressavam-se num comunicar fácil, marcado por recordações dum viver diferente e com um dinamismo muito próprio e característico de outros climas.

A primeira página da edição n.º 0, em Maio de 1984

Esta peculiar forma de ser e estar foi muitíssimo bem aproveitada pelo nosso querido Padre Manuel que soube capitanear este Leme levando a que, através dele, se aliassem esforços e vontades congregando, alertando e consciencializando os que ali viviam. Sem quaisquer serviços básicos dignos desse nome, não havendo Correio, o jornal era entregue, porta-a-porta, pelos paroquianos, as assinaturas faziam-se por angariação directa, no contacto informal ou, a jeito alegre e de forma convicta, do altar abaixo, pois “o Leme chegava a toda a parte e era o melhor jornal do mundo”!

Assim, congregando muitas vontades, mensalmente, o Leme lá vinha, impresso das terras de Braga, fazendo de cada edição uma conquista! Nele se reflectiam a vida de muitos, as preocupações e carências das gentes que ali viviam que, com condições precárias aos mais variados níveis, iam desenvolvendo eventos de diversa natureza, alguns muito simples mas de uma riqueza humana inolvidável. Muitos foram os que deram e, ainda hoje, muitos são os que continuam a dar, o seu contributo ao Leme e seria impensável nomear nomes sem correr o risco de nos esquecermos de alguém.

Outros directores deram os seus braços ao Leme, José Paulo, Jorge Oliveira, Paulo Mesquita, António Novais e actualmente Abílio Raposo, tentando sempre seguir os princípios que norteiam este projecto, onde a inspiração cristã não é fundamentalista e a causa humano-divina é profunda. Identificados num mesmo espírito que será, sem dúvida, muito o mesmo, na fidelidade ao fundador. Vontade de fazer acontecer, de fazer crescer uma comunidade viva, animando a que os diferentes interesses e vontades contribuíssem para o todo e lutando, lutando sempre, pelos mais fracos, os mais frágeis, tentando que a terra tivesse o bem-estar que todos mereciam!

Hoje o Leme tem 30 anos, chegando a Santo André, o que vimos não nos leva a adivinhar o que ali então se viveu. A vida polua nas ruas, o seu traçado moderno entrecortado pelo verde, fazem-nos sentir num espaço único, já diferente mas que respeita a “lagartixa”, “as panteras”, “os pica-paus”, a génese do que se vive, descobre-se no então vivido!

Continua, continuará por bem a existir em muitos corações essa paixão pelo Leme. Um incontável número de gentes, de todas as idades por ali tem passado. Quantos projectos, iniciativas promoveu! Jamais se apagarão da memória, que o importante se não perca, outras vivências. O Leme mora ainda no coração do seu fundador, o Padre Manuel, de forma inexplicável, mora no daqueles que, agora bimensalmente, o programam, redigem, corrigem, paginam, encadernam e pelos que, em terras distantes, o aguardam, para ler as notícias frescas da terra e continuar a beber desse espírito, mares afora.

O timoneiro não é mais o mesmo, mas o seu espírito permanece ligado à sua terra de missão, que está sempre presente na oração diária. Os tempos são agora outros, urge mudar e adaptar o jornal a novos desafios, prementes e inadiáveis, e até nisso devemos ver fidelidade. Cercado de gente que lhe quer muito bem, restanos apenas dizer que o Leme tem ainda muitas marés para navegar! Esta barca tem a força dos que acreditam que os sonhos dão luta mas, são conquista que a todos enobrece, e no espírito dos que um dia o sonharam, só temos mesmo de ousar novos mares, sem medo de navegar!

Por Carla Nascimento e Fátima Moita